sexta-feira, 10 de junho de 2016

Poesia do Caio



Ninguém saberá da secura de nossos olhos
da dureza de nossa boca ninguém saberá
do fio das unhas da dor no dente
do sangue guardado no fundo da gaveta

ninguém adivinhará os jardins atrás do muro fechado
ninguém quebrará o ferro do portão
ninguém violentará o secreto
ninguém te tocará profundamente
ninguém te saberá
ninguém.

Por isso olhamos as nuvens
sentados ao vento que não sopra
enquanto os balanços rangem
os rádios cantam
e a rua à nossa frente
é tão intocável como um quadro
pintado por outro.

Por isso olhamos em volta
e o que se passa além de nossa {palavra ileg.}
não nos soluciona
(ninguém sabe
ninguém saberá).

O caule quebrado do girassol
o livro de Toynbee sobre os degraus
a caneta riscando o papel
as nuvens
a tarde
a rua

o medo.

20 de dezembro de 1975

2 comentários:

Elaine Cuencas disse...

Ele tinha um relacionamento incomum com a palavra, não é? É pouco dizer isso, mas eu, que não tenho essa capacidade, só posso dizer assim... que texto triste e verdadeiro a respeito da nossa importância no mundo dos vivos. Ninguém nunca vai entender o que sentimos, porque por mais empáticos que sejam nossos queridos,aquilo que sentimos é nosso, só nosso... em nossa solidão existencial. Beijos, querida leitora!

Andréa disse...

Tinha sim, meu bem.. Tinha sim. Não tenho essa capacidade também.

Um beijo